Amar e Acolher

Formação em Educação Parental

Prosperando em família através do entendimento do cérebro infantil

Foto: Fernanda Jorge

Antes de ter filhos você pensou que precisaria entender determinados comportamentos infantis?

Você pensou que deveria entender o motivo pelo qual as crianças se jogam no chão pelo simples fato de você ter entregue ao seu filho o copo azul, mas ele queria o vermelho?

Você pensou que precisaria entender o que acontece no cérebro de um bebê que chora até dormir?

E o que acontece no cérebro do seu filho quando ele comete um erro e é acolhido?

E o que faz se sentir seguro quando você não está presente a ponto de encorajá-lo a enfrentar o primeiro dia de aula? 

Mas calma, nem os pais mais cuidadosos, iriam pensar nesses mínimos detalhes. Simplesmente porque temos a tendência de confiar nos saberes mais profundos, que dizem respeito sobre nós, aos profissionais que trabalham diretamente com crianças: Pediatras, Neuropediatras, Pedagogos, Professores, Psicólogos Infantis e Educadores Parentais. 

Porém nos esquecemos que antes de recorrer a qualquer desses profissionais temos algo muito importante dentro de nós, uma espécie de manual, uma bússola interna chamada “intuição”. Muitas vezes preferimos deixar de observar o que nosso filho está nos comunicando através do comportamento para compará-lo com o desenvolvimento e o comportamento de outras crianças. Observa-se a Maria, que é sempre quietinha e obediente e não olham para o João que é ativo, comunicativo e “bagunceiro”. 

Acham que o problema é do João, pelas demandas que ele traz, mas se esquecem de olhar que o problema está no “manual” que rotulou as duas crianças diante do que é ser obediente. 

O desejo de um filho obediente fala muito sobre os medos dos pais quando pensam em educação e responsabilidade. Mas se esquecem do principal: o desenvolvimento da autonomia e visão crítica de argumentação. Queremos uma resposta rápida à nossa necessidade de controle. “Ao criar filhos para a obediência, os cuidadores mantêm uma rédea curta, que coloca as crianças sempre num lugar inferior, de menor valor e de menor estima.” (BARROS, Lua. Eu não nasci mãe, pág 125). 

Crianças obedientes aprendem que brigar pelos seus desejos é algo ruim e vergonhoso. Aprendem a ter o seu olhar pela visão dos pais e, assim, se afastam das suas próprias vontades e do seu sentir sem levar em consideração aquilo que é importante para elas mesmas. 

Foto: Fernanda Jorge

Quanto mais entendemos sobre o cérebro humano, mais temos espaço para dialogar e construir relações saudáveis. Porém, entender sobre o Cérebro Infantil não evitará que a criança passe por todas as fases necessárias do seu desenvolvimento, isso inclui viver todas as experiências que passamos ao longo da nossa vida: medos, alegrias, memórias afetivas, traumas, construção de valores, etc. 

O cérebro tem o poder de armazenar os acontecimentos mais importantes da vida de um ser humano, sejam essas memórias afetivas ou memórias de trauma. Portanto, tudo que fica armazenado está relacionado com o ambiente externo e como o ambiente interno (sentimentos) vive determinada experiência. 

Uma parte de extrema importância no cérebro infantil e que compõe essa construção de memórias, é o Sistema Límbico, composto pela amígdala, hipocampo e medula. Este sistema representa uma espécie de “mochila das emoções” no cérebro infantil. Os três se comunicam entre si e definem o que será armazenado ou não. 

Acontece que se a criança vive em um ambiente externo onde há muita desordem, brigas, gritos e agressão física, ela pode até não sofrer os impactos disso naquele momento da infância. Mas, ao chegar na vida adulta, ela poderá viver um simples momento que trará à tona todos os traumas que ficaram guardados na infância. É o que chamamos de “gatilhos”.

Gatilhos acontecem por coisas simples, mas que demonstram que há traumas ocultos no cérebro. E, a partir daí, entendemos as grandes dificuldades de se relacionar que muitas pessoas têm. 

A amígdala é a “fonte” de construção do medo – sentimento que move os gatilhos. Por isso, palavras de afirmação, acolhimento, gentileza, firmeza, consistência e não se esquecer que você é o adulto da relação ajudam bastante nos momentos desafiadores. 

A grande questão que precisamos tomar cuidado ao acessar essas informações que acabei de citar acima é não assumirmos o lugar de “herói” na vida de seus filhos. Ao recebermos todas essas informações e termos contato com a parentalidade consciente temos a tendência de querermos evitar todo tipo de situação ou frustração na vida de nossos filhos. Achamos que se assumirmos características que fazem parte de uma educação respeitosa (cama compartilhada, amamentação prolongada, introdução alimentar consciente, desfralde gentil, etc) estamos no caminho correto para termos filhos incríveis e perfeitos. 

Acontece que todo ser humano possui seu lado luz e o seu lado sombra e nada é garantia de que seu filho será alguém “fora da curva”. Simplesmente porque o cérebro infantil se modula pela convivência no ambiente em que vive. De nada adianta buscar uma educação respeitosa se os pais dessa criança não são respeitosos com os outros em que convive. É preciso ser aquilo que se ensina. O que molda o cérebro infantil são as experiências. 

Daniel Siegel afirma que para termos uma vida equilibrada e criativa, cheia de experiências saudáveis e com relacionamentos conectados, é fundamental que nossos dois hemisférios cerebrais (esquerdo e direito) funcionem juntos. Assim as crianças saberão lidar com a lógica, com o concreto, literal, linguístico (hemisfério esquerdo) e as emoções, o holístico, não verbal, intuitivo (hemisfério direito) ao mesmo tempo. 

Nos primeiros anos de vida até os três/quatro anos o lado direito é mais predominante, ou seja, a fase em que a criança mais tem descontroles emocionais (birras) é justificada. Conseguimos comprovar também que todo esse comportamento desafiador não é algo que a criança faz para nos manipular. É tudo meio sem sentido e sem lógica para o seu filho. Entendido isso, reflita se é possível a criança entender com facilidade que às 19h é hora de tomar banho? Escovar os dentes antes de dormir é higiênico? 

Na perspectiva de Daniel Siegel, para promovermos a integração dos dois hemisférios no cérebro da criança é primeiro necessário conectar e redirecionar. Você conecta-se com o hemisfério direito do cérebro da criança quando utiliza sinais não verbais, expressões faciais que transmitem segurança e acolhimento, toque físico, tom de voz carinhoso, e escuta ativa. Assim, você usa o seu hemisfério direito para se conectar com o hemisfério direito do seu filho. 

Um grande indício de que seu filho está começando a usar mais de maneira lógica, concreta e literal o lado esquerdo do cérebro é quando ele inicia a fase dos “porquês”. – a partir dos 4 anos – , trazendo um pouco mais de equilíbrio para os comportamentos desafiadores. 

Dessa forma, podemos partir para o redirecionamento e conectar os hemisférios esquerdos dos pais com a criança. Assim, fica muito mais fácil lidar com os problemas de maneira racional. 

Orientar e encontrar soluções são os últimos passos a serem tomados após o equilíbrio entre os dois hemisférios. Somente após a homeostase que podemos de fato fazer uma intervenção lógica sobre o comportamento infantil. 

Entendido isso, podemos então aprofundar em cada etapa do desenvolvimento infantil, para que você possa saber o que esperar em cada idade do seu filho. 

  • A criança de um ano: regras e combinados não funcionam. Para todo o seu funcionamento cerebral, tudo é concreto. Não há diferença entre passado, presente e futuro, tudo acontece no agora. Por isso, repetir mil vezes é necessário para que ela possa associar e aprender. Não há diferença entre daqui cinco minutos, cinco horas ou daqui a pouco, para ela tudo é dinâmico e esperar é uma eternidade. Diga sempre o que ela deve fazer e evite dizer a palavra “não”. “Carinho na mamãe” ao invés de “não pode bater na mamãe”. O choro é a principal forma de comunicação e por isso seu filho vai chorar. Cada criança ao seu modo e de acordo com a sua necessidade. Por isso, não compare seu filho achando que ele chora demais ou chora de menos. Ele chora ao seu modo. 

 

A criança de um ano precisa mexer em tudo para se desenvolver, as habilidades motoras precisam ser testadas e desenvolvidas. Experimentar novas texturas, abrir e fechar, jogar no chão, fazem parte da sua curiosidade e são as principais formas de desenvolvimento para a idade. O corpo grita por aprendizado, em todos os sentidos. Gritar e bater fazem parte da sua tentativa de comunicação e, por isso, o acolhimento, paciência e disponibilidade emocional é fundamental para os pais passarem pela fase junto com a criança sem maiores desgastes. O cansaço físico dos pais torna-se o mais desafiador diante das demandas da criança de um ano. 

A criança de dois anos: os pais percebem uma diferença significativa em seus filhos nesta fase. A criança perde a característica do bebê fofinho e se torna mais comunicativa e, por consequência, mais agressiva. A agressividade ocorre pela tentativa de se expressar, falar em palavras o que sente e pensa, mas sem saber ou conseguir usar as palavras corretas. Os gritos também se intensificam e por isso a calma e tranquilidade dos pais é totalmente necessária. Ajudar a criança a ampliar o seu vocabulário é fundamental. Nesta fase, o uso de telas é um grande vilão. 

A criança de dois anos, descobre que são seres separados dos pais e por isso querem fazer tudo sozinhas e do seu jeito. Erros, acertos e várias tentativas movem a criança para o crescimento. O toque físico e a explicação dos pais com voz em tom baixo, estando na mesma altura da criança são muito mais eficientes do que um grito da cozinha pedindo para não riscar a parede da sala. Essa eficiência na comunicação são importante porque assim, a criança consegue assimilar mais claramente o abstrato com o concreto. Lembra do equilíbrio e bom funcionamento dos hemisférios direito e esquerdo? Seu filho sempre vai reagir melhor ao toque do que as palavras. 

Nesta fase entender a ordem das coisas traz o sentido para entender como a vida funciona. Rotina e previsibilidade é fundamental para o seu pequeno cérebro imaturo não dar curto circuito. Assim, conseguimos entender o porquê de você ter que ler mil vezes a mesma historinha ou da criança só aceitar tomar suco no mesmo copo verde. 

A criança de três anos: aparece a grande necessidade de se opor aos pais e a dificuldade de seguir as regras e ordens se intensificam. É o melhor momento para os pais reverem as regras, combinados e limites da casa. A capacidade imaginativa da criança está a todo vapor, como uma forma de preparo para o princípio do amadurecimento do Sistema Límbico aos quatro anos. Os sonhos e pesadelos passam a ser frequentes, pois tudo vivenciado durante o dia se torna realidade. Os sonhos ao dormir servem como uma forma de elaborar tudo que foi vivenciado no dia. A criança nesta idade se sente realmente pertencente à família e por isso, a necessidade  de contato físico e disponibilidade emocional dos pais torna-se prioridade na vida da criança. É tempo de ser propositivo e disponível afetivamente ao seu filho. Os combinados e regras já são compreendidos e aceitos pela criança, mas os caminhos cerebrais necessários diante do bom comportamento ainda passam por dificuldades e, por isso, ainda ocorrem momentos de descontrole emocional. 

A criança de quatro anos: a criança percebe que regras e combinados estão presentes em tudo, são convenções sociais para se ter uma boa convivência. Por isso querem criar suas próprias regras. É um excelente momento para abrir espaço para o diálogo e saber a hora de ceder. Também é neste momento em que os pais devem ter clareza sobre quais caminhos da educação desejam que seus filhos percorram. A imaginação está a todo vapor e diante disso pode ocorrer episódios de mentiras com o intuito de manipular a própria imaginação. A criança se perde no que é real e imaginativo, pois acreditam que tudo que acontece em suas cabecinhas é verdadeiro e concreto. Neste momento as intervenções familiares devem ser feitas de forma firme e gentil, para que a criança sinta quais os limites de até onde pode ir, mas não tenha a sua criatividade e capacidade imaginativa impactadas. Importante os pais não acharem que isso é um desvio de caráter. É um ponto delicado em que toda criança passa, porém precisa ser bem orientada e guiada pela família. 

A criança de cinco anos: pum, xixi, cocô e arroto serão palavras presentes no vocabulário. O crescimento é nítido e perceptível. A noção de tempo e espaço da criança fica clara: ontem, hoje, amanhã. Percebem sentimentos e emoções com mais facilidade, sua percepção de empatia fica mais bem estabelecida. Diante disso, observam quando o amiguinho, os pais ou pessoas próximas estão chorando, com raiva, tristes e etc. Porém a noção do que é “meu” e o que é do outro ainda não está bem estabelecida. Por isso, não brigue se encontrar objetos de outros amiguinhos na sua casa, oriente, acolha e explique que não é legal. O medo se torna presente: medo de ficar sem os pais, medo de morrer, medo de perder o bichinho de estimação. Na cabeça da criança o medo se torna grandioso e verdadeiro. Acolha, acolha e acolha! As birras se tornam menos frequentes e a linguagem e verbalização ganham espaço, os hemisférios esquerdo e direito passam a ter mais equilíbrio. Se a família educa através da inteligência emocional, é possível perceber grandes conquistas na comunicação e verbalização sobre as emoções. 

A criança de seis anos: de repente, se tornam pessoinhas que sabem o que querem e qual lugar pertencem ao mundo. Se tornam mais questionadoras, com pensamento crítico avaliando as situações e os relacionamentos que fazem parte de sua vida. É frequente a frase: “você não manda em mim”. Passam a responder os pais pensando no que os mesmos querem ouvir e não no que realmente é para elas. Por isso, as mentiras se tornam frequentes. Querem ser validados e aceitos a todo momento. A mentira não é intencional, é apenas uma tentativa de se sentir aceito. É necessário que a família esteja aberta ao diálogo e focada sobre a intenção de onde deseja chegar na educação de seus filhos. É preciso que fique claro a construção de cárater e honestidade de maneira amorosa. Ser visto e validado pelos pais é muito importante. 

A criança de sete anos: compreendem melhor as expressões da nossa linguagem (ironia, sarcasmo e interpretações de duplo sentido). Falar em código com alguém já não é possível quando se tem a intenção de não deixar a criança perceber. As perguntas sobre o abstrato e efêmero ganham foco: o que é universo?, quem é Deus?, o que é amor? o que é transar? Porém, ainda precisam do lúdico para compreenderem suas emoções. 

A criança de oito anos: ainda possuem sua autoimagem frágil, embora tenham empatia pelos outros. É a fase mais importante para a construção da valorização sobre quem são. Por isso, dizer a eles “você esquece tudo, já falei para tirar a toalha molhada de cima da cama!” os fazem se sentir incompetentes e perdidos. Deixe bilhetes sinalizando as tarefas a serem feitas, mas não falem nada que interfira na construção de seu self. Aos oito anos precisamos ter bem consolidado nossa visão sobre nossos próprios valores pessoais. É esta construção saudável que fará seu filho dizer “não” diante das situaçãoes que são desrespeitosas consigo. É preciso tomar cuidado com o que se fala. Ela ainda não consegue tirar proveito dos comentários negativos que dizem e, assim, ponderar e crescer com eles. Seu instinto para a liberdade está gritando e os amigos começam a ter um pouco mais de espaço em sua vida do que a família. Por isso, os episódios de “rebeldia” são mais frequentes. A necessidade de ser aceita é extremamente importante para a criança de oito anos. E, as vezes, podem mentir para os amigos para serem bem vistas. E você já sabe né? Converse e dialogue com seu filho sobre as atitudes dele. Tenha claro para você sobre aonde você quer que seu filho chegue. 

A criança de nove anos: o fim da infância e o sentimento de “estou perdido” do seu filho. Nesta fase tudo perde o interesse: as bonecas, os carrinhos, os jogos, o estilo do quarto. A criança se sente tão perdida que pode voltar a ter comportamentos como de bebê: falar com vozinha fininha, se agarra na mãe, medo de dormir sozinha à noite. Se frustra facilmente e tem muito medo de errar. Importante conversar e explicar o quão seguro ela está. Muda de ideia facilmente, pois lidar com a persistência ainda é algo difícil. Hoje quer fazer natação, amanhã prefere aula de música. Muito cuidado com o que se fala próximo a essa criança, facilmente se magoa e acha que a briga dos pais é por causa dela. Mas não se preocupe isso tudo é uma preparação para a melhor fase que especialistas dizem: os felizes dez anos. 

A criança de dez anos: os descontroles emocionais se tornam bem menos frequentes. A parceria com os pais e os amigos são ricas e constantes, especialmente com os amigos. Pertencer é muito importante. As vezes, entram em conflitos com os pais para cumprir combinados com os amigos e se sentirem pertencentes ao vínculo social. Tudo o que os amigos dizem tem muita importância. Confiança é a palavra da fase dos dez anos. Querem confiar e sentir que são confiados. Confiança para eles é o mesmo que se sentir amados. Se sentir amado é a motivação que precisam para irem para a adolescência confiantes de si. Muito cuidado para não confundir confiança com imposição de opiniões, o caminho contrário a isso é a mentira. Seu filho pode mentir para você nessa idade porque não sente que pode confiar em você verdadeiramente. 

 

Seja a ponte que leva seu filho a novos lugares: de dentro para fora.

Foto: Fernanda Jorge
Hellen Varoto

Hellen Varoto

Educadora Parental certificada em: Facilitadora em Emoções / Disciplina Positiva / Parentalidade Consciente / Formação em estudos familiares / Sono & Apego Seguro / Terapia Cognitivo Comportamental na infância e adolescência.

"A inteligência emocional do seu filho vai mudar o mundo!"

Pedagoga das Emoções & Criadora do Método Criando com Ternura
Mais de 300 famílias colocando a teoria na prática.

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